Um livro e duas curiosidades
"As Leis do Céu - Astronomia e Civilizações Antigas" é um livro de Juan António Belmonte, um astrónomo que se dedica à arqueoastronomia, a partir das ilhas Canárias. A edição portuguesa, recomendada pela Sociedade Portuguesa de Astronomia, tem bastantes falhas ao nível do que deveria ter sido a revisão do português. Vêem-se por todo o livro palavras ainda na sua versão castelhana e erros na colocação de vírgulas, o que distrai a leitura.
Sendo a arqueoastronomia um tema interdisciplinar, este livro corre o risco de não agradar totalmente nem a quem se interesse por astronomia, nem a quem se interesse por arqueologia. Do ponto de vista de quem tem uma formação em "ciências duras", é um pouco decepcionante que o trabalho de investigação se resuma, praticamente, ao estudo da orientação de monumentos. É que, aceitando erros de meio grau a um grau e meio, e tendo uma lista bastante generosa de direcções privilegiadas, entre acontecimentos anuais associados a numerosas estrelas e constelações, fica-se com a sensação de que todas as interpretações astronómicas são possíveis, e nunca se pode excluir a hipótese de que não haja, para um determininado monumento, um alinhamento com motivação astronómica.
Há, no entanto, bastantes assuntos interessantes abordados no livro, a começar pela lista exaustiva dos ciclos de tempo, logo no início, a história do calendário actual, e um apêndice sobre a observação do céu.
Destaco, de entre todos os temas tratados, dois que me chamaram mais a atenção.
Em primeiro lugar, a Lua. Quem vive numa cidade, quase nem lhe liga, e mesmo os agricultores, pelo menos no nosso país, não lhe prestam mais atenção do que a necessária para saber em que fase está. Ora, tal como o Sol nasce (e se põe) em locais diferentes ao longo do ano - mais a norte no solstício de Verão e mais a sul no solstício de Inverno - também a lua apresenta um comportamento semelhante, mas mais complexo:
"A Lua orbita num plano que não é nem o do equador nem o da eclíptica [o plano da órbita da Terra em torno do Sol], mas que está inclinado uns 5º relativamente à segunda. Aliás, este plano sofre um movimento de bamboleio cuja consequência é que a linha de intersecção entre ambos os planos, chamada linha dos nodos não está fixa, antes sofre um movimento de precessão com um período de cerca de 18,6 anos, o ciclo nodal [...] Como consequência disto, num mês sideral a Lua executa uma dança sobre o horizonte similar à executada pelo Sol ao longo de todo o ano, com a diferença de que os extremos desta dança não são fixos, variando, não só em cada mês, mas também ao longo do ciclo nodal.
"A Lua terá não dois, mas quatro lunastícios [o equivalente aos solstícios, para a Lua] em cada ciclo nodal, ao alcançar as declinações extremas de ±(µ+5º) no lunastício maior (norte e sul) e de ±(µ-5º) no lunastício menor (norte e sul) [µ representa a latitude do lugar] quase nove anos e meio mais tarde. De facto, a Lua estará em média uns sete anos em cada par de lunastícios e uns dois ou três anos «viajando» entre eles, pelo que o nome, em princípio, está plenamente justificado."
É espantoso que os astrónomos da antiguidade possam ter observado estas diferenças!
A segunda curiosidade tem que ver com a precessão dos equinócios, o rodopiar do eixo da Terra, como um pião, em ciclos de 25,776 anos. Este movimento é responsável pela variação da direcção para a qual aponta o eixo da Terra e, consequentemente, para diferentes estrelas "polares", importantes para a navegação em mar alto, longe da costa, que poderia ter sido feita no Mediterrâneo pelos fenícios.
Segundo o autor, este movimento foi identificado pelos astrónomos antigos. Se pensarmos que a concepção do mundo em épocas remotas era necessariamente geocêntrica, deve ter causado grande admiração este "bamboleio"... de todo o universo! Ainda segundo o autor, este movimento teria sido atribuído a Perseu (que identifica com Mitra), que o teria conseguido ao matar o Touro celeste. Para o apoiar, usa uma citação do apologista cristão Hipólito, "que, no século III d.C. nos diz que Perseu é 'o eixo alado, que mantém ambos os pólos ligados ao centro da Terra e faz rodar o Cosmos'". E continua dizendo que "se, como propõe Ulansey, o leão é uma manifestação alternativa do deus, a figura do deus leão alado, como uma representação alternativa de Mitra, é explicada de forma simples como uma visão do eixo do mundo (eclíptico e não polar neste caso) sobre o qual se enrosca a serpente (a nossa constelação do Dragão). Na realidade, é uma nova forma de entender a velha ideia do axis mundi [de Mircea Eliade]". Um pouco rebuscado, mas quem sabe...?
1 :
Mas quem é que escreve este blog??..A sério está muito bem organizado!..
Parabens!!..
Onde é que vão a tanta informação e a tanta coisa interessante??..Adorei o blog!!..Continuem!!
enviado por Anónimo em abril 07, 2007 8:38 da tarde
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