Medir estrelas
(Com uma vénia ao Comandante António Estácio dos Reis, que foi quem me fez perceber, de uma assentada, como é simples a utilização do astrolábio náutico e da balestilha.)
"A navegação fazia-se então no Mediterrâneo e no Atlântico, com suporte costeiro, pelo método de rumo e estima, isto é, usando os rumos da agulha de marear e estimando as distâncias percorridas.
"Todavia, em meados do século XV, no seu trajecto ao longo da costa africana, os pilotos portugueses verificaram que as viagens para o Sul se faziam com ventos de feição, enquanto o regresso se tornava difícil, por vezes impossível, devido a ventos contrários. Para tornear essa situação, passou a fazer-se a 'volta pelo largo', que passava pelas proximidades dos Açores, o que tornava as viagens de regresso bem mais longas em caminho percorrido, mas mais curtas em tempo e mais cómodas para as tripulações.
"A volta pelo largo, ou volta da Mina ou da Guiné, como também se apelidava, impedia que se determinasse a posição do navio pelo reconhecimento da costa, como até então se fazia.
"Para superar esta dificuldade, recorreu-se aos astros, em primeiro lugar à Estrela Polar. A sua altura media-se, usando o quadrante, por exemplo, à saída de Lisboa, e registava-se-lhe o valor no próprio instrumento. Depois, ao navegar-se um ou mais dias, ou no porto seguinte, media-se novamente a altura da Polar. A diferença entre estas alturas, convertida em léguas, que era, na época, a unidade de distância usada no mar, dava o caminho percorrido Norte-Sul. A unidade de conversão, a primeira a ser usada pelos pilotos portugueses, foi de 16 2/3 léguas por grau. Mais tarde, por volta do fim do século, utilizou-se a relação de 17 1/2 léguas por grau.
"Esta fase da navegação astronómica deduz-se da leitura da Relação do Descobrimento da Guiné, quando do achamento da ilha de Santiago, em Cabo Verde, por Diogo Gomes, cerca do ano de 1460. Ali se afirma: 'E eu tinha um quadrante, quando fui a estes países, e escrevi na tábua do quadrante a altura do pólo ártico.'
"O método exigia que o piloto fizesse pontaria ao astro, com este sempre na mesma posição no céu, sendo ajudado pela constelação da Ursa Menor de que a Estrela Polar faz parte e que, na época, descrevia em torno do pólo uma circunferência com o raio de 3º.5. O inconveniente deste procedimento era obrigar o piloto a fazer a observação, em cada noite, num determinado momento, o que nem sempre era possível, devido ao céu estar encoberto."
("Medir Estrelas", António Estácio dos Reis, CTT Correios de Portugal, 1997)